segunda-feira, 9 de novembro de 2009

O Grande Encontro

E se Edward Mãos de Tesoura encontrasse com Sweeney Todd - O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet? Talvez fosse assim:



vi aqui.

(clique na imagem para ampliá-la)

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Onde vivem os monstros?

Minha nova paixão-fofura-literária-infantil se chama "Where The Wild Things Are", escrita e ilustrada pelo brilhante Maurice Sendak. A obra é antiga, de 1963, e bastante popular e premiada nos Estados Unidos. Sucinto de tudo e ousado, o livro vai "estrear" no cinema em 1º de janeiro de 2010, com adaptação assinada por Spike Jonze, o diretor de, entre outros, "Quero Ser John Malkovich". Antes disso porém, a publicação chegará (ou já chegou há pouco), pela primeira vez ao Brasil, com o nome de "Onde Vivem os Monstros", assim como o longa.

E a história é a prova de que, às vezes, não precisamos lá de muitas firulas para nos encantarmos por um personagem. No caso ele é Max, um garotinho travesso e com olhar malvado, que, ao ir para a cama sem jantar, começa a se imaginar e viver num mundo inóspito e repleto de "criaturas selvagens".

"The night Max wore his wolf suit and made mischief of one kind
and another
his mother called him 'WILD THING!'
and Max said 'I'LL EAT YOU UP'
so he was sent to bed without
eating anything.
That very night in Max's room a forest grew..."

Abaixo, um gostinho do que será o filme:

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Num dia ensolarado


"...Eu quero a sorte de um chofer de caminhão
Pra me danar por essa estrada, mundo afora, ir embora
Sem sair do meu lugar..."

sábado, 17 de outubro de 2009

Mary and Max

Acordei nessa manhã chuvosa de São Paulo e zanzando num site aqui, outro acolá, achei um presente australiano cinza e colorido, o trailer da animação "Mary and Max", de Adam Elliot. Delicado e charmoso todo.

Para tingir esse dia com um sorriso, assista:

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Mentiram para mim

...mas hoje o sol não apareceu por aqui, seu moço. nem as pedras do caminho. foram todos juntos de mãos dadas, o sol amarelinho e as rochas avermelhadas.

a imagem eu peguei daqui.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Para o sol

E foi assim, a moça abriu o e-mail na noite fria e lá estava a surpresa da amiga que, por algum tempo, preferiu virar tatu-bola para se proteger de alguns perigos da grande travessia. Ela só queria se tornar invulnerável aos dentes dos cães, igualzinho mesmo ao tatu. Mas descobriu que os girassóis existem.

Quase uma oração

"Um dia a gente acorda e percebe que mudou, depois de levar muita porrada e ter os ossos moídos junto aos sonhos.
Um dia a gente acorda e percebe que nem toda mudança precisa ser amarga,
embora o que nos mova quase sempre seja a dor, esta parceira do imprevisto.
Um dia a gente acorda e descobre do lado do avesso um espaço zen, uma espécie de paz interior que nos adula e acaricia,
como se a mãe voltasse a nos pegar no colo.
Neste dia, inexplicavelmente,
decidimos que o melhor a fazer
numa manhã é plantar um girassol
só para ver, dali a um tempo,
sem angústia, dilema ou rejeição,
que a vida dança a dança dos dervixes...
e que a nossa entrega à vida
é um ritual sem hoje nem amanhã.
A felicidade pode ser o ato de movimentar -se
como os girassóis, para lá e para cá,
só pra ver onde começa e onde termina o dia...
sem pressa.
Os acontecimentos não nos pertencem."

de Célia Musilli

domingo, 6 de setembro de 2009

Folheando "Alice"


Alice, onde estás?

Curiosa criança, remota Alice, empresta-me teu sonho:
Eu desprezaria os contadores de histórias de hoje,
Seguiria contigo o riso e o fulgor:
Estou fatigado, esta noite, de santos e pecadores.
Somos amigos, desde que Lewis e o velho Tenniel
Encerraram tua imortalidade em vermelho e dourado.
Vem! Tua ingenuidade é uma fonte perene.
Deixa-me ser jovem de novo antes de ser velho.
És um espelho de juventude: esta noite escolho
Perder-me profundamente em teus labirintos mágicos,
Em que a Rainha Vermelha vocifera em esplêndidas nuances
E o Coelho Branco segue apressado seu caminho.
Vamos mais uma vez nos aventurar de mãos dadas:
Faze-me de novo acreditar — no País das Maravilhas!

Vincent Starrett

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Zé Tristonho


E foi o homem querer ser livre.
Apagou as luzes, fechou a porta do quarto.
Quando acordou, sentiu-se leve.
Mas aquela coisa permanecia, nalgum lugarzinho.
Diziam que era tudo da cabeça. Ele, esperto, nunca acreditou.
Não queria mais frustrações, então, decidiu abdicar dos planos.
Ouviu os ensinamentos das manhãs de sábado e aceitou a impermanência.
Dançou de olhos fechados numa festa animada.
Foi ao cinema sozinho ver um filme de terror.
Porém, o medo, seu grande companheiro da vida toda, continuava lá.
Até que chorou pois decidiu abandonar esse velho amigo estranho.
Criou coragem, pediu dez receitas para o doutor e prometeu ser feliz.


Gravura do Cadjoo. Clique nela e veja mais trabalhos dele.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Apenas o Fim?


De tudo ficou um pouco
Do meu medo. Do teu asco.
Dos gritos gagos. Da rosa
ficou um pouco

Ficou um pouco de luz
captada no chapéu.
Nos olhos do rufião
de ternura ficou um pouco
(muito pouco).

Pouco ficou deste pó
de que teu branco sapato
se cobriu. Ficaram poucas
roupas, poucos véus rotos
pouco, pouco, muito pouco.

Mas de tudo fica um pouco.
Da ponte bombardeada,
de duas folhas de grama,
do maço
- vazio - de cigarros, ficou um pouco.

Pois de tudo fica um pouco.
Fica um pouco de teu queixo
no queixo de tua filha.
De teu áspero silêncio
um pouco ficou, um pouco
nos muros zangados,
nas folhas, mudas, que sobem.

Ficou um pouco de tudo
no pires de porcelana,
dragão partido, flor branca,
ficou um pouco
de ruga na vossa testa,
retrato.

Se de tudo fica um pouco,
mas por que não ficaria
um pouco de mim? no trem
que leva ao norte, no barco,
nos anúncios de jornal,
um pouco de mim em Londres,
um pouco de mim algures?
na consoante?
no poço?

Um pouco fica oscilando
na embocadura dos rios
e os peixes não o evitam,
um pouco: não está nos livros.

De tudo fica um pouco.
Não muito: de uma torneira
pinga esta gota absurda,
meio sal e meio álcool,
salta esta perna de rã,
este vidro de relógio
partido em mil esperanças,
este pescoço de cisne,
este segredo infantil...

De tudo ficou um pouco:
de mim; de ti; de Abelardo.
Cabelo na minha manga,
de tudo ficou um pouco;
vento nas orelhas minhas,
simplório arroto, gemido
de víscera inconformada,
e minúsculos artefatos:
campânula, alvéolo, cápsula
de revólver... de aspirina.

De tudo ficou um pouco.

E de tudo fica um pouco.
Oh abre os vidros de loção
e abafa
o insuportável mau cheiro da memória.

Mas de tudo, terrível, fica um pouco,
e sob as ondas ritmadas
e sob as nuvens e os ventos
e sob as pontes e sob os túneis
e sob as labaredas e sob o sarcasmo
e sob a gosma e sob o vômito
e sob o soluço, o cárcere, o esquecido
e sob os espetáculos e sob a morte escarlate
e sob as bibliotecas, os asilos, as igrejas triunfantes
e sob tu mesmo e sob teus pés já duros
e sob os gonzos da família e da classe,
fica sempre um pouco de tudo.
Às vezes um botão. Às vezes um rato.

"Resíduo", de Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, 12 de maio de 2009

entre homens e paquidermes


"...A hora, tão matutina, e o segredo com que havia sido organizada a saída, explicavam a ausência de curiosos e outras testemunhas, havendo que ressalvar, no entanto, a presença de uma carruagem do paço que se pôs em movimento na direcção de lisboa quando elefante e companhia desapareceram na primeira curva da estrada. Dentro, iam o rei de portugal, dom joão, o terceiro, e o seu secretário de estado, pêro de alcáçova carneiro, a quem talvez não vejamos mais, ou talvez sim, porque a vida ri-se das previsões e põe palavras onde imaginámos silêncios, e súbitos regressos quando pensámos que não voltaríamos a encontrar-nos...."

Trechinho de "A Viagem do Elefante", de José Saramago

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Notícias de uma Guerra Particular

"A memória nos leva a lugares onde precisamos ir"

A técnica da animação "Valsa com Bashir" é a rotoscopia. O que o diretor Ari Folman passa sobre o massacre nos campos de Sabra e Chatila, no Líbano, é uma mescla de subjetividade com lembranças alheias. A sensação que ficamos após a cena final é a de tristeza.

E o pensamento que estava lá nas bandas de Beirute só voltou para a avenida Paulista quando, no ponto de ônibus, encontrou um rosto conhecido e sorridente.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Arte de rua

De tanto subir e descer aquela mesma ladeira todos os dias. De dia. De noite. Ou em certas madrugadas de festa, a moça virou pintura e agora faz companhia à menininha que antes não sorria.

terça-feira, 31 de março de 2009

Simplesmente Feliz

O olhar era preocupado e os passos apressados. Nos braços, carregava um segredo pesado e extraordinário que fazia sua cabeça doer aos sábados.

Quando perdeu sua bicicleta de estimação sentiu-se plena. Era uma mulher bonita, embora tivesse lá algumas esquisitices, como gostar da palavra "estrambólico."

Era rodeada por culpas e vivia repetindo "me perdoe" a qualquer um. Não acho que tivesse motivos para tanto, em todo caso ela gostava disso.

Não tinha paciência para ouvir música e odiava feijão. Preferia as comidas insossas. Doces? Só de vez em quando.

Raridade era sair ao sol, o sorriso se abria mesmo era para os dias cinzentos e noites chuvosas sem estrelas.
Mas, na verdade, talvez não fosse triste.

Para conhecer mais gravuras do artista plástico Cadjoo, dê um pulinho no Cenas do Crime.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Diga trinta e três


Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:
— Diga trinta e três.
— Trinta e três . . . trinta e três . . . trinta e três . . .
— Respire.

....................................................................................

— O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

Manuel Bandeira

quinta-feira, 12 de março de 2009

terça-feira, 10 de março de 2009

Para pintar de cores um dia cinza e chato...


...e para ilustrar algo que li sobre ele, o tal do amor.

Ainda não sei direito o que estou achando de "Carta a D. - História de um Amor", do filósofo André Gorz. Mas outro dia vi num blog duas definições sobre o amor, esse sentimento tão indizível ou sem tradução mesmo e, então, fiquei pensando em como eu o explicaria caso alguém me perguntasse. Eis que chego na página 20 e encontro algo bem bonito e direto:

“O amor é o fascínio recíproco de duas pessoas por aquilo que elas têm de menos dizível, de menos socializável; de refratário aos papéis e imagens delas mesmas que a sociedade lhes impõe; aos pertencimentos culturais."


(Clique na imagem para conhecer mais trabalhos de Hollis Brown Thornton)

quarta-feira, 4 de março de 2009

Às pedras


Na falta do bendito tempo, que se contrapõe aos tempos sem inspiração e que, coincidentemente, se cruzam aos obstáculos, sejam os de matéria mineral sólida ou os invisíveis, ainda bem que existe a poesia. Ainda bem.


No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra

Carlos Drummond de Andrade

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Todo Carnaval Tem Seu Fim


Ao fundo uma música tristonha tocava enquanto ela colova as últimas peças do armário dentro da mala cor-de-rosa. Estava atrasada para pegar o ônibus, mas deu tempo de deixar um bilhete embaixo do copo com flores. Verificou o horário ao mesmo tempo em que seu olhar confirmou que nada ficara para trás. De chinelo no pé e vestido rodado no corpo, desceu as escadas, passou pela pequena sala de jantar e saiu pelos fundos, ligeira tal qual um vento frio. Aquela moça não se importava com o que diziam ser "bons modos" ou coisas do tipo. Na verdade, odiava despedidas como Garfield a segunda-feira. Ela já tinha atravessado a rua quando, lentamente, a porta se fechava e ainda era possível ouvir os ecos da canção pela fresta.

Toda banda tem um tarol, quem sabe eu não toco
Todo samba tem um refrão pra levantar o bloco
Toda escolha é feita por quem acorda já deitado
Toda folha elege um alguém que mora logo ao lado
E pinta o estandarte de azul
E põe suas estrelas no azul
Pra que mudar?

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Pernambuco, imortal, imortal

No carnaval meu coração foi pra Pernambuco. Ele se dividiu em várias partes e está passeando pelo Galo da Madrugada, se perdendo pelas ruas do Recife Antigo, se vestindo de Papangu em Bezerros e subindo e descendo as ladeiras de Olinda. E já que eu fiquei, aqui vai a minha homenagem carnavalesca:


Voltei Recife
Luis Bandeira

Voltei, Recife
Foi a saudade Que me trouxe pelo braço

Quero ver novamente Vassoura
Na rua abafando
Tomar umas e outras
E cair no passo

Cadê Toureiros?
Cadê Bola de Ouro?
As Pás, Os lenhadores
O Bloco Batutas de São José?

Quero sentir
A embriaguês do frevo
Que entra na cabeça
Depois toma o corpo
E acaba no pé

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

O Lutador

"The only place I get hurt is out there. The world don't give a shit about me"


Paradoxalmente indigesto, impressionante e belo. Mickey Rourke irreconhecível e perfeito.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

De filha para pai


Quando a sorridente Maddy tinha 9 anos resolveu que entrevistaria um escritor especial. Para a maioria das crianças isso seria algo um tanto quanto complicado. Mas não para ela. O tal escritor era especial, acima de tudo, por ser seu pai, que, digamos, não é assim qualquer pai. Pela foto vocês já devem ter percebido se tratar de Neil Gaiman. E não é que mesmo com a pouca idade a garotinha se saiu muito bem na entrevista. Clique aqui para ouvir os Gaiman nesta conversa.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

De Carlos Drummond de Andrade

O Elefante


Fabrico um elefante

de meus poucos recursos.

Um tanto de madeira

tirado a velhos móveis

talvez lhe dê apoio.

E o encho de algodão,

de paina, de doçura.


A cola vai fixar

suas orelhas pensas.

A tromba se enovela,

e é a parte mais feliz

de sua arquitetura.

Mas há também as presas,

dessa matéria pura

que não sei figurar.

Tão alva essa riqueza

a espojar-se nos circos

sem perda ou corrupção.

E há por fim os olhos,

onde se deposita

a parte do elefante

mais fluida e permanente,

alheia a toda fraude.


Eis meu pobre elefante

pronto para sair

à procura de amigos

num mundo enfastiado

que já não crê nos bichos

e duvida das coisas.

Ei-lo, massa imponente

e frágil, que se abana

e move lentamente

a pele costurada

onde há flores de pano

e nuvens, alusões

a um mundo mais poético

onde o amor reagrupa as formas naturais.


Vai o meu elefante

pela rua povoada,

mas não o querem ver

nem mesmo para rir

da cauda que ameaça

deixá-lo ir sozinho.

É todo graça, embora

as pernas não ajudem

e seu ventre balofo

se arrisque a desabar

Ao mais leve empurrão.


Mostra com elegância

sua mínima vida,

e não há na cidade

alma que se disponha

a recolher em si

desse corpo sensível

a fugitiva imagem,

o passo desastrado

mas faminto e tocante.


Mas faminto de seres

e situações patéticas,

de encontros ao luar

no mais profundo oceano,

sob a raiz das árvores

ou no seio das conchas,

de luzes que não cegam

e brilham através

dos troncos mais espessos.


Esse passo que vai

sem esmagar as plantas

no campo de batalha,

à procura de sítios,

segredos, episódios

não contados em livro,

de que apenas o vento,

as folhas, a formiga

reconhecem o talhe,

mas que os homens ignoram,

pois só ousam mostrar-se

sob a paz das cortinas

à pálpebra cerrada.


E já tarde da noite

volta meu elefante,

mas volta fatigado,

e as patas vacilantes

se desmancham no pó.

Ele não encontrou

o de que carecia,

o de que carecemos,

eu e meu elefante,

em que amo disfarçar-me.

Exausto de pesquisa.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

O mundo secreto de Caroline


— Não, é CORALINE. Meu nome é Coraline Jones e, não, Caroline!
— Desculpe, menininha, me embaralhei com as letras.

Estava curiosa para ver a adaptação de "Coraline" (Neil Gaiman) para o cinema. E, mais uma vez, o trabalho do diretor Henry Selick ("O Estranho Mundo de Jack") emocionou e, por alguns momentos, me fez voltar à ingenuidade da infância. O colorido contraposto pelo ar nebuloso de algumas cenas deu uma pitada a mais de beleza e vida à história de Gaiman.

A Coraline do filme é a mesma do livro, com alguns acréscimos de impaciência, rebeldia e menos gotas de doçura. Porém, continua encantadora e curiosa. Mas confesso que senti falta de um gato mais blasé e rabugento.

O pai de Coraline estava em casa. Tanto seu pai quanto sua mãe trabalhavam fazendo coisas no computador, ou seja, ficavam bastante tempo em casa. Cada um tinha seu próprio estúdio.
— Olá, Coraline — saudou ele sem se virar quando ela entrou.
— Mmm — murmurou Coraline. — Está chovendo.
— É — disse o pai. — Está caindo um pé d´água.
— Não — disse Coraline. Está apenas chovendo. Posso sair?
— O que sua mãe acha?
— Ela disse: você não vai sair com um tempo desses, Coraline Jones.
— Então, não.
— Mas quero continuar minha exploração.

"Coraline e o Mundo Secreto" estreia nesta sexta-feira (13).

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

A ilha


Viajando com a família pelo litoral, o pai de Terê olha para a garota e diz:
— Filhinha, agora você vai conhecer uma ilha. Está enxergando aquela porção de terra envolta pelo mar bem ali ao fundo?
— Estou, respondeu prontamente.
— Então, aquilo é uma ilha. É para lá que estamos indo.
— Mas, pai, cadê o coqueirinho?


Para ler a matéria sobre a curiosa ilha acima, clique na foto.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Mistureba

Aquela Chapeuzinho decidiu, de supetão, ser diferente. Passou pelo Lobo sem medo, deixou de lado sua cestinha e foi passear em outra floresta. Agarrou bem forte a mão de Manuel Bandeira e saiu cantarolando:

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha falsa e demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
- Lá sou amigo do rei -
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Sobre batatas e músicas


A chuva caía e as batatas e o bife à milanesa já tinham feito a minha alegria do domingo. Mas ainda faltava alguma coisa. Desde a última vez em que estive no "La Frontera" uma frase troncha não saía da minha cabeça e, mais uma vez, precisei abrir o cardápio para lembrá-la.

Las fronteras
se mueven como
las banderas

Achei aquilo forte e lindo. Na primeira parada em frente ao computador, fui pesquisar sobre o tal Jorge Drexler que assinava o trecho. Foi aí que tive duas surpresas. A primeira foi encontrar o clipe (hilário) de "Frontera", música de onde veio a frase. Bem ao cotrário do contexto que imaginava estar aquelas palavras, mas não menos divertido:



A outra coisa foi descobrir que o uruguaio Jorge Drexler é o mesmo cara que compôs "Al Otro Lado del Río", música-tema de "Diários de Motocicleta"(2004), vencedora do Oscar de melhor canção original em 2005.

E foi entre batatas e ao som destas músicas que o domingo, sem chuva, terminou.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

O indizível mundo de Salinger


Lá pelos meus 13, 14 anos eu li "O Apanhador no Campo de Centeio". O livro, que tinha sido do meu pai, estava todo estropiado e cheio de grifos, o que já me fez ficar mais interessada. O fato é que me encantei pelo jeito como o misterioso J.D. Salinger narrava a vida do jovem Holden Caulfield. Terminado esse, ganhei um presente, era uma outra obra do escritor.

Quando abro o embrulho uma surpresa: "Carpinteiros, Levantem Bem Alto a Cumeeira e Seymor, uma Apresentação". O nome, no duro, como costumava dizer Caulfield, me deixou curiosa e intrigada. Eu mal sabia que a maior surpresa viria algumas páginas à frente.

Se ainda existe no mundo alguém que leia só por prazer - ou até mesmo por acidente -, peço a ele ou a ela, com indizível afeto e gratidão, que divida em quatro partes iguais a dedicatória deste livro com minha mulher e meus dois filhos.

Indizível soou com estranhamento para mim naquela época, assim como o universo de Salinger. Tanto que nunca me esqueci dessa palavra que traduz exatamente aquilo que não se pode dizer. E foi ali, também, que comecei a gostar das dedicatórias de livros.

Na Revolutionary Road

E depois daquela longa dança o sonho acabou, mas não o amor.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Água o amor não é

Corridinho

O amor quer abraçar e não pode.
A multidão em volta,
com seus olhos cediços,
põe caco de vidro no muro
para o amor desistir.

O amor usa o correio,
o correio trapaceia,
a carta não chega,
o amor fica sem saber se é ou não é.

O amor pega o cavalo,
desembarca do trem,
chega na porta cansado
de tanto caminhar a pé.

Fala a palavra açucena,
pede água, bebe café,
dorme na sua presença,
chupa bala de hortelã.

Tudo manha, truque, engenho:
é descuidar, o amor te pega,
te come, te molha todo.
Mas água o amor não é.

Adélia Prado


Clique na imagem e você poderá ver outras tantas igualmente belas, diretamente do Flickr da autora, a designer Anna Cunha.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Estados Unidos de Tara

Estreou a série (aqui no Brasil, por enquanto, só baixando) “United States of Tara”, escrita por Diablo Cody, roteirista oscarizada por “Juno”, e produzida por sir. Steven Spielberg. A atriz Toni Collette vive a personagem principal, Tara (ou T ou Alice ou Buck), uma mulher dona de quatro personalidades.

A graça é essa: uma mulher poder ser quatro pessoas diferentes em questão de minutos. Claro que, em um primeiro momento, isso soa como absurdo. Também fiquei encucada no episódio piloto. Só que é aos poucos que Toni Collette, no papel de qualquer uma das quatro, vai mostrando ao que veio (ou ao que vieram todas elas, criadas pela ex-stripper Diablo Cody, à base de algumas tiradas e asperezas).

Tara é feliz com o marido Max (John Corbett) e com os dois filhos, Kate (Brie Larson) e Marshall (Keir Gilchrist). Aparentemente normal e desencanada, trabalha como pintora de murais para quarto de bebês, porém, às vezes, não se sente, digamos, “ela mesma”, já que minutos depois pode encarnar alguma de suas outras personalidades.

T é uma adolescente que faz o estilo sem vergonha, pinta as unhas de preto e usa roupas provocantes que pega do armário de Kate. Uma faceta mais comportada de Tara surge com a irritantemente perfeita dona-de-casa e exímia cozinheira Alice. No entanto, a família se constrange quando Tara faz o tipo caminhoneiro ao assumir a identidade de Buck, um homem chegado em bebidas, noitadas e porradas.

A música do Polyphonic Spree tornou a abertura de "United States of Tara", uma animação em estilo pop-art, ainda mais bonita.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Disgusting

Não sabia que sentia tanto asco, nem tanta repulsão por esse inseto pequeno da família dos Blactídeos, de antenas compridas e multiarticuladas, conhecido por barata. Isso foi até ler esse trecho (ao final) de "A Paixão Segundo G.H.", de Clarice Lispector. Aí sim, tudo aumentou.

Até a busca (preciso confessar) por uma foto para ilustrar o post foi difícil e, claro, muito nojenta, mas, finalmente, achei uma barata engraçadinha e que não me causasse aversão na hora de salvá-la. A figura é bem diferente daquela descrita por Clarice através de G.H., porém aqui o que vale é o texto abaixo:

"Só que ter descoberto súbita vida na nudez do quarto me assustara como se eu descobrisse que o quarto morto era na verdade potente. Tudo ali havia secado - mas restara uma barata. Uma barata tão velha que era imemorial. O que sempre me repugnara em baratas é que elas eram obsoletas e no entanto atuais. Saber que elas já estavam na Terra, e iguais a hoje, antes mesmo que tivessem aparecido os primeiros dinossauros, saber que o primeiro homem surgido já as havia encontrado proliferadas e se arrastando vivas, saber que elas haviam testemunhado a formação das grandes jazidas de petróleo e carvão no mundo, e lá estavam durante o grande avanço e depois durante o grande recuo das geleiras - a resistência pacífica. Eu sabia que baratas resistiam a mais de um mês sem alimento ou água. E que até de madeira faziam substância nutritiva aproveitável. E que, mesmo depois de pisadas, descomprimiam-se lentamente e continuavam a andar. Mesmo congeladas, ao degelarem, prosseguiam na marcha... Há trezentos e cinqüenta milhões de anos elas se repetiam sem se transformarem. Quando o mundo era quase nu elas já o cobriam vagarosas."

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

By Jeff Tweedy

LAUGHS

the greatest songs
are never sung
but the grass
get cut
and spelled
in children´s hands
how the sun is yellow
but also cold and sutured
...blue

the best laughs
never leave your lungs
and the best life
is art
never made


O poema acima está no livro "Adult Head", de Jeff Tweedy, que além de poeta é compositor, vocalista e líder do Wilco. Para ser sincera, eu conheço Tweedy e sua banda há pouco menos de um ano, mas ela já é uma das minhas preferidas. Virou meu tesourinho, com direito a camiseta de fã e tudo.

domingo, 25 de janeiro de 2009

Quem Quer Ser um Milionário?


Um dos fortes concorrentes ao Oscar 2009, Slumdog Millionaire (ou em português "Quem Quer Ser um Milionário?") é um filme simples, produzido sem muita grana e com atores desconhecidos do grande público. Porém, o diretor inglês Danny Boyle ("Trainspotting") soube fazer dessa simplicidade o encanto do longa, sem cair em pieguices.

O drama é focado em Jamal Malik (Dev Patel), um garoto pobre indiano que, junto de seu irmão Salim, vive pelas ruas de Mumbai passando por todas as dificuldades que duas crianças "sozinhas no mundo" poderiam passar.

Jamal, mesmo sem saber, é cômico. Também é ingênuo, forte, de caráter incorruptível e é teimosamente defensor das coisas em que acredita, mas talvez disso ele saiba muito bem. E, talvez por isso, tenha chegado ao ápice: o famoso programa de televisão "Quem Quer Ser um Milionário?."

Com delicadeza, a história, baseada no livro "Sua Resposta Vale um Bilhão", de Vikas Swarup, se passa em flashes entre Mumbai e algumas outras cidades indianas, intercalando o passado e presente da vida de Jamal, fazendo disso, também, um breve suspense. E tudo acompanhado pela (linda) trilha sonora de A.R. Rahman. Muito mais legal (e real) do que a novela de Glória Perez.

Como o filme tem estreia prevista no Brasil somente para 6 de março, fica aqui o trailer:

domingo, 18 de janeiro de 2009

O Curioso Caso de Benjamin Button

"Sua vida é definida pelas oportunidades, até mesmo aquelas que você perde"

Na curiosa vida de Benjamin Button o tempo do relógio corria ao contrário. Avançava de trás para frente, como se fosse rebobinada. Quando enrugado brincava de bonecos, afinal, nascera em um corpo velho e, com o passar dos anos, rejuvenescia. Tinha uma vida do avesso. Benjamin era inteligente, carinhoso e lúcido como poucos.

Boa parte de sua vida invertida fora marcada por perdas e, logo, as perdas viraram mortes e Benjamin partiu sozinho para a grande travessia. Pelo caminho, conheceu muitos lugares e pessoas que o marcaram também. Gostava de ouvir a história que o capitão Mike contava sobre os beija-flores e o infinito. Voltou para New Orleans, reencontrou seu grande amor, viveu indo e vindo.

De tanto retroceder sua vida chegou ao fim. E Benjamin, no corpo de um bebê, porém com as peculiaridades de um idoso, morreu. Virou eco.

O filme:
Roteirizado (livremente) por Eric Roth, a partir do conto de F. Scott Fitzgerald, "O Curioso Caso de Benjamin Button", de David Fincher ("Clube da Luta"), é uma linda fábula sobre um homem que nasce com as características de um homem velho e morre jovem, tal qual um bebê. Com Brad Pitt no papel de Benjamin e Cate Blanchett vivendo o grande amor do personagem principal, o filme, além dos efeitos visuais, da maquiagem e das interpretações, é também uma densa reflexão sobre duas coisas que, na verdade, caminham ao mesmo passo: a vida e a morte.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

A Paixão Segundo G.H.


A POSSÍVEIS LEITORES

“Este livro é como um livro qualquer.
Mas eu ficaria contente se fosse lido apenas
por pessoas de alma já formada.
Aquelas que sabem que a aproximação,
do que quer que seja, se faz gradualmente
e penosamente – atravessando inclusive
o oposto daquilo que se vai aproximar.
Aquelas pessoas que, só elas,
entenderão bem devagar que este livro
nada tira de ninguém.
A mim, por exemplo, o personagem G.H.
foi dando pouco a pouco uma alegria difícil;
mas chama-se alegria”


Abri o livro "A Paixão Segundo G. H." Virei uma, duas, três páginas. Na quarta paraliso ao ler o texto acima. A partir daí já fico vidrada. Não é à toa que Clarice Lispector é tida como musa .

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Noite


Certo dia, por ironia, ela leu em "Minha Razão de Viver", de Samuel Wainer, que "é à noite que se sabe das coisas." Nunca mais se esqueceu disso. E ponto e pronto, disse Clarice.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Coraline


Confesso que me tornei fã de Neil Gaiman há pouco tempo. Foi logo depois de ler "Os Lobos Dentro das Paredes" e a versão portuguesa de "O Dia em que Troquei o meu Pai por Dois Peixinhos Dourados" (ainda inédito no Brasil) . Dei mais um passo em direção à fantasia do escritor inglês e aos traços do ilustrador Dave McKean até chegar em "Coraline."

A cada página me sinto como se estivesse lá, com a entediada garotinha que pegou a fria chave e abriu a porta.

O dia estava ensolarado e frio, exatamente como aquele que Coraline deixara.
Um barulho sutil fez-se ouvir atrás dela.
Coraline virou-se. Em pé, sobre o muro próximo a ela, achava-se um gato grande e preto, idêntico ao gato grande e preto que vira no terreno de casa.
— Boa tarde — disse o gato.
Sua voz soava como a voz de dentro da cabeça de Coraline, a voz com a qual ela pensava as palavras; mas essa era uma voz de homem, não de menina.
— Olá — disse Coraline. — Eu vi um gato como você no jardim lá de casa. Você deve ser o outro gato.
O gato balançou a cabeça.
— Não — disse. — Não sou o outro coisa nenhuma. Sou eu. — Inclinou a cabeça para o lado; os olhos verdes brilhavam.
— Vocês, pessoas, se esparramam por toda parte. Nós, gatos, nos mantemos íntegros, se é que me entende.

Enquanto leio o final da história, espero a estreia de "Coraline" no cinema e, mais uma vez, confesso: estou curiosa para ver como ficou o novo trabalho de Henry Selick ("O Estranho Mundo de Jack").

domingo, 4 de janeiro de 2009

Do poeta Zé da Luz


Ai se sêsse

Se um dia nois se gostasse
Se um dia nois se queresse
Se nois dois se empareasse
Se juntim nois dois vivesse
Se juntim nois dois morasse
Se juntim nois dois drumisse
Se juntim nois dois morresse
Se pro céu nois assubisse
Mas porém acontecesse de São Pedro não abrisse
a porta do céu e fosse te dizer qualquer tulice
E se eu me arriminasse
E tu cum eu insistisse pra que eu me arresolvesse
E a minha faca puxasse
E o bucho do céu furasse
Tarvês que nois dois ficasse
Tarvês que nois dois caisse
E o céu furado arriasse e as virgi toda fugisse